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CULTURA

Zilda Brandão
30/07/2024 às 10:46hs


O espetáculo traz os elementos da dramaturgia shakespeariana clássica para a linguagem drag contemporânea, sem que nem uma nem outra se desfigurem no processo – isso é, sem que Shakespeare perca em poesia e tragicidade, e sem que a drag se descaracterize naquilo que ela tem de mais autêntico: a dissolução das fronteiras estéticas e o desafio aos papéis tradicionais de gênero.

Como conta a diretora Ines Bushatsky, “quem está em cena é aquilo que, ao longo do processo, chamamos de ‘a drag total’. Para além da comicidade em que já estamos habituados a vê-la, é a drag nesse registro trágico. Vamos do cômico ao trágico, do performático ao teatrão, às vezes dentro de uma mesma cena”.

Mercedez Vulcão lembra que a drag sempre esteve no teatro, mas, por razões religiosas e patriarcais, acabou sendo estigmatizada e marginalizada. “Ainda hoje, há aqueles (artistas, inclusive) que enxergam a drag como uma arte ‘menor’. Por isso a importância de colocá-la no centro de um palco como este, protagonizando uma obra de Shakespeare. Parece, mas não é uma novidade. É na verdade o resgate de espaços que há muito já nos pertenceram”.

Alguns inclusive propõem que o termo “drag” teria sido cunhado pelo próprio Shakespeare, sob a forma de uma nota de rodapé em um manuscrito, indicando que o ator deveria se vestir com roupas de mulher (em inglês, drag seria uma sigla para “dressed resembling a girl”). Na época, não era permitido que as mulheres atuassem nas peças e as personagens femininas eram interpretadas por homens. Ao longo dos séculos a arte drag se expandiu, e hoje vai muito além, englobando um pensamento moderno sobre visagismo, costura e performance para tensionar os papeis tradicionais de gênero.

Ginger Moon complementa: “embora nunca tenha saído dos palcos, infelizmente durante muito tempo a drag ficou fora do teatro mais mainstream. Isso está mudando, mas ainda é pouco perto da quantidade de drag queens, drag queers e drag kings talentosas que existem”. Para ela, ainda, o processo de criação do espetáculo foi uma oportunidade de conviver com outras artistas drag em um espaço diferente das festas e baladas. “Muitas vezes a drag é uma arte solitária. A gente acaba tendo que fazer tudo sozinha, do figurino à maquiagem e à produção, além da performance”. Nos ensaios, conta, o elenco descobriu novas formas de companheirismo e irmandade. 

“A arte drag é ampla e multifacetada, no elenco convivem perspectivas estéticas diferentes, e complementares. Não existe só uma maneira de fazer drag, as possibilidades são inúmeras. Assim, o espetáculo contribui para mostrar também a diversidade desse universo”, complementa a diretora.

A montagem

Na tragédia de Shakespeare, Lear, rei da Bretanha, está muito velho e anuncia que decidiu dividir seu reino entre suas três filhas: Goneril, Regan e Cordelia. Antes de passar a coroa, o monarca pergunta: “qual das três me ama mais?”. Quem demonstrasse maior amor pelo pai ganharia a maior porção de terras. Cordelia, a mais nova e a única que o ama genuinamente, se recusa a participar daquele jogo. Furioso, Lear decide condenar a caçula ao exílio. 

Após o banimento da irmã, Regan e Goneril começam uma luta violenta pelo poder. Traído pelas filhas, o velho rei vê seu reino à beira de uma guerra e afunda em uma espiral de loucura, arrependido por banir a única pessoa que o amou de verdade.

Com figurinos de Salomé Abdala e visagismo de Malonna e Polly, a montagem da Cia. Extemporânea imagina um mundo drag queen, onde todos os eventos e conflitos são modulados por essa estética. Nessa perspectiva, Lear é uma “mama drag” e suas filhas estão disputando o poder. 

“A peça mostra como a tragédia shakespeariana e a arte drag têm vários pontos de contato”, conta João Mostazo. “O que fomos descobrindo é que a drag tem em si toda a potência trágica, ela acessa toda a complexidade de emoções que compõe a tragédia. E, por outro lado, com as suas sacadas de linguagem, provocações e irreverência, Shakespeare é também muito mais drag do que normalmente se supõe”.

Essa intersecção está, por exemplo, no uso que o espetáculo faz de recursos como o lipsync, número de dublagem típico da cultura drag: “Quando o rei enfim se joga no abismo da loucura, ele o faz performando, como se estivesse em uma boate, dublando e dançando. A loucura é sublinhada pela perda de identidade da drag. É como se Lear se perguntasse: por que estou dublando, por que estou dançando, quem sou eu?”, complementa a diretora.

A montagem, que conta ainda com cenário de Fernando Passetti e luz de Aline Santini, desperta também uma discussão sobre o ato político de Cordelia, que, ao desafiar o pai, provoca um efeito propriamente revolucionário, desorganizando por inteiro aquela sociedade. Dessa forma, a montagem destaca a relação íntima entre ação política e compromisso ético, pois a recusa da personagem é, no fundo, uma recusa a seguir reproduzindo a mentira que sustentava aquele mundo.

 

Sobre a Cia. Extemporânea

Fundada em 2015, a Cia. Extemporânea tem como horizonte de pesquisa a intersecção entre comédia e violência, com foco para a produção de dramaturgia autoral e a encenação de temas de relevância política e social. Desde a sua criação a companhia vem desenvolvendo uma pesquisa consistente que já atravessou diversas abordagens e temas, levando o grupo a alcançar um lugar de cada vez maior destaque na cena paulistana atual. 

Entre 2015 e 2024 a companhia criou as peças Fauna fácil de bestas simples (2015), A demência dos touros (2017) e Roda morta: uma farsa psicótica (2018), B de Beatriz Silveira (2021), O mistério cinematográfico de Sendras Berloni (2022), Dr. Anti (2022) e A gente te liga, Laura (2024).

Sinopse

Lear, rei da Bretanha, decide dividir o reino entre as suas três filhas, Cordelia, Regan e Goneril. Porém, Cordelia se recusa a participar do ritual de passagem da coroa, e o rei, furioso, a condena ao exílio. O exílio de Cordelia põe em marcha a completa desagregação do reino. Sem coroa, traído pelas filhas e vendo seu reino à beira da guerra, Lear afunda em uma espiral de loucura.

 

Serviço

Rei Lear, da Cia. Extemporânea

Temporada: 26 de julho a 25 de agosto*

Às sextas e aos sábados, às 20h, e aos domingos, às 18h

*Sessão dia 22 de agosto, , às 15h

Sessões com acessibilidade em libras 9 e 10 de agosto

Sesc Consolação – Teatro Anchieta – Rua Dr. Vila Nova, 245, Vila Buarque

Horário de funcionamento: terça a sexta, das 10h  às 21h30. Sábados, das 10h ás 20h. Domingos e feriados, das 10h ás 18h30.

Ingressos: R$50,00 (inteira), R$25,00 (meia-entrada) e R$15.00 (credencial plena)

Venda online em sescsp.org.br  a partir de 16/7 (terça), às 17h

Venda presencial na bilheteria de qualquer unidade do Sesc SP a partir de 17/7 (quarta), às 17h

Classificação: 14 anos

Duração: 120 minutos 

Capacidade: 280 lugares

 

Acessibilidade: teatro acessível a cadeirantes e pessoas com mobilidade reduzida






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